Pequei, Senhor, mas não, porque hei pecado
Da vossa alta piedade me despido:
Antes quanto mais tenho delinquido,
Vos tenho a perdoar mais empenhado.
Se basta a vos irar tanto pecado,
A abrandar-vos sobeja um só gemido:
Que a mesma culpa, que vos há ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado.
Se uma ovelha perdida, já cobrada,
Glória tal e prazer tão repentino
Vos deu, como afirmais na Sacra História,
Eu sou, Senhor, ovelha desgarrada:
Cobrai-a e não queirais, Pastor Divino,
Perder na vossa ovelha a vossa glória.
MATOS, Gregório de. Obras Completas. 2ª ed. t.I. São Paulo: Edições Cultura, 1945. Série Clássica Brasileiro-Portuguesa, "Os mestres da língua", t.I, p.5, "Epigramas"III